(COM)POSSIBILIDADES:OS 50 ANOS DO MAIO DE 68 com-possibilidades_os_50_anos_do_maio_de_68 | Page 54

A dupla ruptura afetiva com o memorial de 1968... transformou em rejeição sistêmica da ordem econômico-so- cial. Se Daniel Cohn-Bendit pôde afirmar que os estudantes se recusavam a ser a próxima geração de exploradores da classe operária, é por que os jovens perceberam a miséria em que vivia esta classe e associaram a miséria da vida sexual estudantil da época com a vida oprimida dos trabalhadores. 1 2. Lembra-se que as faculdades de filosofia e ciências humanas da época eram equivalentes em poder social aos cursos de administração hoje. Se é verdadeiro que governos autori- tários não desejam dar condições para que a população se instrua, é falso que a revolta veio da disciplina universitária que se denomina a filosofia. No período pós-Guerra, a filo- sofia contribuía à formação dos poderes. Por isso também, produzia, quando necessário, perspectivas contra os poderes. Em meados dos anos sessenta, a falta de vagas para prolongar a formação escolar em institutos de ensino superior explodiu em uma frustração sobre sexo para se transfigurar em uma revolução política em que alunos de colégios foram frequen- temente entre os manifestantes mais enfurecidos. Nas Amé- ricas, foi na província do Québec onde esta configuração revolucionária que se formou a partir de uma nova classe política de estudantes, universitários e pré-universitários, também tomou proporções revolucionárias em 1968-69. 3. Ao considerar os desdobramentos nas Américas, volta-se a salientar categoricamente que uma análise de maio de 68 de Paris deve resistir à tentação de separar esta revolução das guerras e lutas contra colonialismo e as consequências da escravidão ocorrendo na mesma década. 1968 se apresenta neste contexto, mesmo que o que virá a representar 1968 é uma repetição da heteronormatividade. A predominância 1 53 « Que voulez-vous exactement, Daniel Cohn-Bendit ? : Notre objectif immédiat, c’est la politisation de l’Université. […] La politisation est partie de là : mise en question du système capitaliste, de la fonction sociale qu’il attribue à l’Université ; refus, de la part des étudiants, d’être de futurs cadres formés pour exploiter la classe ouvrière. » Entretien avec Daniel Cohn-Bendit, « Que voulez-vous exactement, Daniel Cohn-Bendit ? », Le Nouvel Observateur, n o 182, 8-14 mai 1968. p. 19.