DESDE 2016, quando o governo do Rio de Ja-
neiro passou a atrasar o pagamento de salários
de parte dos servidores públicos, além da luta
na justiça e dos muitos atos políticos em pro-
testo contra essa situação, uma rede de solida-
riedade é mantida em favor dos funcionários e
suas famílias que mais sofrem em decorrência
desse quadro. Aliás, não é difícil entender esse
sofrimento: imagine que você é pai de família
e o único responsável por pagar as contas de
sua casa. O que fazer se, mesmo tendo traba-
lhado o mês todo, não consegue nem ao menos
colocar comida na mesa, pagar contas de luz e
água, entre outras necessidades básicas?
Para além da dificuldade de pagar as con-
tas, a crise não afeta apenas o bolso de milhares
de cidadãos fluminenses, mas também a saúde
emocional de muitos dos servidores ativos e apo-
sentados do estado. A professora da rede públi-
ca estadual e membro do Sindicato Estadual dos
Profissionais da Educação do Rio de Janeiro no
município de Duque de Caxias, Rose Cipriano,
conta que há diversos casos de angústia e de-
pressão causados por essa situação. Por isso, é
fornecida ajuda psicológica a quem não consegue
lidar emocionalmente com a falta de recursos.
“Isso agrava ainda mais o já complicado
contexto da educação pública, cujas condições
de trabalho são, em geral, bastante precárias”,
argumenta Rose. Segundo ela, a categoria dos
professores é uma das que mais sofrem com pro-
blemas de saúde como a Síndrome de Burnout
(distúrbio psíquico de caráter depressivo, pre-
cedido de esgotamento físico e mental intenso
que atinge muitos profissionais, especialmente
das áreas de saúde, educação, segurança, entre
outros). Num desses casos, um grupo de quatro
professores (formado pela própria Rose Cipria-
no e por Renata Róseo, Nádia de Aquino Soares
e Mônica Rosa) chegou a ir à casa de uma co-
lega que vive sozinha e apresenta um quadro
depressivo preocupante, especialmente depois
de algumas mensagens que ela mesma divul-
gou por WhatsApp. Além de acolhê-la, o grupo
resolveu assumir parte das contas da professora
até que ela voltasse a receber o salário.
INICIATIVAS COLETIVAS E PESSOAIS
Gestos como esses se multiplicam por todo o
estado do Rio, tanto em nível pessoal quanto
coletivo. Para ajudar as famílias em dificul-
dade, uma série de entidades estão se mobili-
zando para levantar recursos e montar cestas
básicas, comprar remédios e outros gêneros de
necessidade básica. A Arquidiocese e demais
dioceses católicas do Rio de Janeiro, bem como
outras Igrejas cristãs e sindicatos, estão entre
essas organizações que atuam em colaboração
com o Movimento Unificado dos Servidores
Públicos Estaduais (Muspe). Entre as principais
ações articuladas pelo Muspe estão campanhas
de arrecadação de mantimentos e distribuição
de cestas básicas. Embora o governo flumi-
nense venha pagando parte dos salários atra-
sados, a situação está longe de se regularizar
totalmente e deve se arrastar pelo terceiro ano
consecutivo. Por isso, a tendência é essa mobi-
lização continuar, afirma Rose Cipriano.
“A crise não afeta apenas o bolso de
milhares de cidadãos fluminenses, mas
também a saúde emocional de muitos dos
servidores ativos e aposentados do estado”
Professora aposentada há seis anos pela rede
pública estadual do Rio de Janeiro, Catarina de
Gouveia e Siqueira, de Resende, afirma que,
desde o início da crise, se engajou num grupo
de outros 93 docentes aposentados de sua cida-
de, conectados via WhatsApp, que assumiu o
lema “SOS Professores aposentados: educação
em luto e na luta”. Ela conta que, com os de-
mais colegas, foi às ruas de Resende para pro-
mover abaixo-assinado e divulgar informações
com objetivo de esclarecer a opinião pública
sobre o que, de fato, estava acontecendo.
A ação, no entanto, parece não ter dado mui-
to resultado. “O grupo pensou, então, em publi-
car uma mensagem de protesto em um outdoor,
mas decidiu usar o dinheiro da divulgação para
ajudar quem tinha mais necessidade”, diz Ca-
tarina. Depois disso, diferentes ações foram fei-
tas, de bazar de roupas usadas a um festival de
Fevereiro 2018 | Cidade Nova |
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