Catálogo Cine FAP Segundo Semestre de 2018 | Page 8
Trechos de: “Whisky Galore!”, por Darragh O’Donoghue.
Em: http://sensesofcinema.com/2005/cteq/whisky_galore/
[...] Whisky Galore! é uma peça clássica de luar escocês escrita por um inglês e
dirigida por um escocês nascido nos Estados Unidos e um filme típico de sua época. É parte
de uma série de filmes (por exemplo: Sei Onde Fica o Paraíso [Michael Powell e Emeric
Pressburger, 1945], Depois do Vendaval [John Ford, 1952] e A Lenda dos Beijos Perdidos
[Vincente Minnelli, 1954]) lançados na década depois da guerra filmados em locais celtas
que estavam muito longe dos centros urbanos destruídos pelos Blitz, presentes em
noticiários de guerra. Em seu jeito cômico e inconstante, o filme oferece uma espécie de
‚revisão‛ da guerra (como O Terceiro Homem [Carol Reed, 1949] ou A Travessia de Paris
[Claude Autant-Lara, 1956]), parodiando os valores da comunidade e resistência à
demagogia bigodudo que havia sido exaltada nesses mesmos noticiários (e filmes) apenas
alguns anos antes. Da mesma forma, Alegrias a Granel! é uma comédia arquetípica de
Ealing, nos moldes do Passaporte para Pimlico (Henry Cornelius, 1949) e The Titfield
Thunderbolt (Charles Crichton, 1953), celebrando o desafio comunal à burocracia opressiva.
O filme também se baseia em uma longa tradição de contrabando (por exemplo, John
Meade Falkner, Moonfleet, 1909, e Daphne du Maurier's Jamaica Inn, 1936), em particular a
obra-prima cômica de Will Hay, Oh, Mr. Porter! (Marcel Varnel, 1937), uma espécie de
precursor do Whiskey Galore! com seu confronto entre oficiais ingleses e nativos gaélicos.
É também o primeiro filme de Alexander Mackendrick, e já podemos ver em
evidência alguns dos temas e modos que floresceriam nas suas maiores obras, Quinteto da
Morte (1955) e Embriaguez do Sucesso (1957): um interesse em diferentes níveis de tempo
(oficial, social, natural e emocional); o uso da música como comentário (muitas vezes
irônico); uma análise dos meios de comunicação, e as várias barreiras (sociais, linguísticas,
etc.) para o seu uso bem sucedido. Tanto o livro quanto o filme são essencialmente obras
sociais, cujos personagens principais são a comunidade envolvida, e não um indivíduo
excepcional. A entrada de cada trabalho nessa comunidade, no entanto, é
significativamente diferente. MacKenzie escreve a sua narrativa com o soldado inglês
Sargento Odd e a resolução de uma conspiração matrimonial - isto serve para ‚normalizar‛
a história para a presumida audiência inglesa, permitindo-lhes acesso a este mundo cómico
através de uma figura ‚guia‛ representativa, que deve trabalhar suas peculiaridades e
segredos de um ponto de vista similarmente ignorante. Mackendrick começa parodiando o
documentário Griersoniano, quando um narrador escocês apresenta o local do filme. Isso
pode parecer um dispositivo igualmente distanciador, no sentido de afastar o observador
"normal" dos nativos malucos, mas acontece que o narrador, tradicionalmente a "voz de
Deus", é um deles, cheio de conhecimento privilegiado e piadas maliciosas, eventualmente
ficando tão bêbado quanto eles. Este uso da forma documental desempenha várias
funções; mais importante, ele fundamenta a narrativa, tornando o seu movimento para o
realismo mágico mais plausível.
Sobre os estúdios Ealing, do qual esse e outros interessantes filmes britânicos faziam parte,
pode-se saber um pouco mais sobre nesse link: http://www.bfi.org.uk/films-tv-
people/4ce2b942d9e0e