Trechos de : “ O “ Elan ” Estrutural de Minelli ”, por Lélio Sottomaior Júnior .
Em Vincente Minnelli , o caráter rigorosamente irrealista de mise-en-scéne , configurado através de uma configuração cromática , exagerada , estilizada , feérica das cores aliada a um tratamento " estrutural " do décor ( ou seja , cenário / pano de fundo ), no qual os personagens se relacionam conflitualmente por meio de travellings-dinamos num sentido de totalidade , faz com que o contato do espectador com a obra transcenda a dimensão reconfortante da verossimilhança trivial , para recobrar através dessa ascensão a um universo mágico semelhante a uma miragem , um jogo de espelhos , um jardim de estátuas ou a uma ópera , o espanto , a surpresa , a interjeição frente aos acontecimentos diários .
A condensação " mágico-formal " de élans , de microvibrações , de detalhes , de fluorescências , de micromacrorealidades : uma arte que debate oniricamente problemas concretos , e na qual o autor tanto mais se realiza quanto mais o espectador for um personagem seu .
Se é tomado ante um filme de Minnelli do mesmo fascínio ou distúrbio com que se assiste certas paisagens pela primeira vez . Obra , portanto , como de qualquer outro grande cineasta , Hitchcock , Visconti ou Lang , cujo propósito é nos fazer olhar de uma " maneira " inteiramente nova e inesperada , gestos e gentes , essa metamorfose perplexante e fatal que transforma uma menina-moça em mulher ( Gigi ), um dandy num engajado político ( Os 4 Cavaleiros do Apocalipse ), um semideus preso a um passado mítico num homem que libera-se ( A Cidade dos Desiludidos ).
Os personagens , ao se embaterem e se entrechocarem no mundo em uma aventura paroxística , num combate desmedido , acabam por descobrir a chave secreta do décor , nele integrando-se . A obra : uma verdadeira educação existencial .