Trechos de:“ As Mulheres de Rainer Werner Fassbinder( VI)”, por Roberto Acioli de Oliveira. Íntegra: https:// cinemaeuropeu. blogspot. com / 2010 / 01 / as-mulheres-de-rainerwerner-fassbinder. html Oprimidas Opressoras
Na opinião de Yann Lardeau, em filmes de Fassbinder como O Amor é Mais Frio que a Morte( Liebe ist kälter als der Tod, 1969), Os Deuses da Peste( Götter der Pest, 1969), Recrutas em Ingolstadt( Pioniere in Ingolstadt, 1970) e Cuidado com a Puta Sagrada( Warnung vor einer heilingen Nutte, 1970), a mulher é“ inexistente”. Elas são totalmente apagadas pelos personagens masculinos e seus desejos são muito convencionais. Ou melhor, elas não tinham desejos senão pelas convenções.
A partir de certo momento, entretanto, é como se a mulher se tornasse para Fassbinder o arquétipo do oprimido: de Martha( 1973) a Nora Helmer( 1974), de O Medo Devora a Alma( Angst essen Seele auf, 1973) a Mamãe Kuster Vai ao Céu( Mutter Küsters Fahrt zum Himmel, 1975), de Uma Mulher de Negócios( Bremer Freiheit, 1972) a A Mulher do Chefe da Estação( Bolwieser, 1977), de Medo do Medo( Angst vor der Angst, 1975) a O Assado de Satã( 1976). Sem esquecer a opressão silenciosa da mulher em Effi Briest( Fontane Effi Briest, 1974) como modelo( todas as imagens deste artigo são de Medo do Medo). Fassbinder admitir inclusive que as mulheres o interessem mais do que outros de seus personagens, como as crianças e os trabalhadores imigrantes:
“ Quando nos confrontamos concretamente com a sociedade, descobrimos o problema das mulheres... Apesar de tudo, acho as mulheres mais apaixonantes [ que as crianças ou os trabalhadores emigrantes ]. As mulheres não me interessam apenas porque são oprimidas, não é tão simples. Os conflitos no interior da sociedade são mais apaixonantes de observar através das mulheres. Porque as mulheres, por um lado, são oprimidas, mas, segundo eu, elas também provocam essa opressão em função de sua situação na sociedade. Por sua vez, elas se servem disso como um instrumento de terror. São as figuras mais apaixonantes da sociedade, os conflitos são mais evidentes com delas”
O roteiro de Medo do Medo foi desenvolvido por Fassbinder a partir das notas autobiográficas de Asta Scheib, uma jovem dona de casa do norte da Alemanha que mais tarde se tornaria escritora. Margot é uma tensa dona de casa da classe média alta às portas da insanidade. Em Martha, filme do qual de acordo com Wallace Steadman Watson Medo do Medo parece uma seqüência, havia um marido controlador, mas as razões de Margot para os recorrentes ataques de ansiedade são pouco evidentes. Lardeau também sugeriu que a revanche em Nora Helmer contra Helmut Solomon parece com a revanche que Martha não é capaz de realizar contra seu marido opressor.
De acordo com Steadman, Medo do Medo antecipa alguns outros filmes de Fassbinder. O medo inexplicável de Margot anteciparia a angústia existencial generalizada em personagens dos filmes dos próximos dois anos. Como o jovem recém casado e muito problemático em Eu Quero Apenas que Vocês me Amem( Ich will doch nur, dass ihr mich liebt, 1976), a criança irada e sádica de Roleta Chinesa( Chinesisches Roulette, 1976) e a insanidade sutil de Hermann Hermann em Despair( 1977).