Texto : “ Madadayo , de Akira Kurosawa ( 1993 )”, por Matheus Kerniski . Em : https :// www . facebook . com / events / 1887232891291981 / permalink / 1894324890582781 /
(...) Akira Kurosawa : É sem dúvidas o maior " nome " ( não confundir com maior cineasta ) do cinema japonês . Uma inevitável porta de entrada , mas por vezes não mais além , sendo um dos fundamentais cineastas-países como Fellini , Bergman , Godard ( algo que também implica numa das categorias mais horrendas desse meio : cinema de " arte "). Eis o paradoxo Kurosawa : ou fica-se ao pé da porta ou fecha-se ela de uma vez . Não há meiostermos . Ou é o cineasta fixo de um interesse limitado , ou é logo preterido pelas portas que abre para Mizoguchi , Ozu , a Nuberu Bagu , etc . Cineasta de um claro deslumbre inicial pelos monólitos incontornáveis que realizou ( Rashomon , Os Sete Samurais , Ran ), que precisam ser atravessados , mas que infelizmente conjugam , junto ao nome maior que os filmes , tamanha sombra capaz de eclipsar outras de suas maiores obras : Dodes ' Kaden , Céu e Inferno , Dersu Uzala , Madadayo . Obra que sabe-se como última , é um filme que pretende vencer a morte , proibi-la de agir durante o decorrer de seus minutos . Acompanhamos uma nova vida para seu protagonista , um professor aposentado entre seus 60 e 70 anos , ou seja , estamos defronte seu renascimento , uma nova juventude de 17 anos , espelhada no recomeçar do próprio Japão do durante e pós-Guerra . Quando perguntam sobre a chegada da morte " Mahda-kai ?" ( Você está pronto ?), não é apenas o professor que responde , mas todo o filme e seu próprio diretor : " Madadayo !" ( Ainda não !). Quando Kurosawa já representava uma memorabilia sagrada de outro tempo , aparece com esse belo Madadayo conservando todo seu drama e tragédia dentro de analogias , silêncio ou elipses ; em um bombardeio que nunca vemos , no sumiço de um gato que nunca mais volta . Todavia , suas turvas águas não desestabilizam as correntes da vida nessa obra de morte . O que Kurosawa deseja abertamente em seu filme terminal são comemorações e alegrias , cervejas e chistes , cantorias e uniões , que ao invés de nos levar para o fim de uma existência , consegue nos recolocar diretamente ao princípio das coisas : o professor lembra-se em um sonho de quando era menino , onde exclamava também " ainda não !" em contexto oposto , agora para seus amigos durante um esconde-esconde . E é disso que se trata este filme : galhofar diante do fim , esconder-se da morte , justo como a criança em sua brincadeira ; pois brinca-se aqui com uma certeza : o corpo e matéria logo vão perecer , mas não a presença duradoura na memória . Seus alunos serão capazes de conservar em si um pouco de sua imagem e semelhança . Sua herança para mundo e vida . É como o gato Nora que desaparece em dado momento do filme , desesperador em primeira instância , pela iminência do fim que evoca , porém metáfora pungente quando percebe-se que outro gato de novas cores chegou pelo outro quintal . Nunca uma imagem , assim tão serena , assim tão natural , foi-me apresentada em cinema acerca da transitoriedade das coisas . (...)