Catálogo Cine FAP Primeiro Semestre de 2018 | Page 21
Texto: “120 Batimentos por Minuto”, por Ruy Gardnier.
Em: https://oglobo.globo.com/rioshow/critica-120-batimentos-por-minuto-22251439
A pior coisa que pode acontecer a um filme militante é subjugar o drama à
mensagem, transformando a fruição do espectador em algo quase escolar. Em “120 batimentos
por minuto”, Robin Campillo resolve brilhantemente esse problema ao filmar o cotidiano dos
membros do grupo como uma narrativa de aventuras, ou como uma grande festa de house
music (os batimentos do título aludem tanto ao coração humano quanto ao andamento da
música eletrônica) em que a causa principal é seguir vivendo, curtindo e amando.
O filme segue a trajetória do grupo Act Up no começo dos anos 90 para
pressionar o governo e as companhias farmacêuticas a tratar a AIDS com mais seriedade e
transparência. O modus operandi do grupo é criar eventos de efeito, realizando passeatas
chamativas, invadindo escritórios de empresas ou fazendo intervenções em escolas para
informar sobre prevenção. Paralelamente, a trama também acompanha as dinâmicas das
assembleias do grupo para discutir ações e refletir sobre estratégias. Ainda que alguns
personagens sobressaiam (em especial o radical Sean, elétrico e comovente, interpretado por
Nahuel Pérez Biscayart), é o convívio em conjunto o que mais importa aqui. O ritmo urgente dá
o tom preciso dessa vida vertiginosa em grupo, em que a ameaça da morte (a grande maioria é
soropositiva) se converte em necessidade de vivenciar intensamente cada minuto.
Vencedor do Grande Prêmio do Júri no último Festival de Cannes, “120
batimentos por minuto” emociona pelo retrato que faz da comunidade LGBT dos anos 90 e
pelo modo como faz a política brotar naturalmente da luta pela vida. É verdade que a tensão
indivíduo/grupo da narrativa se desequilibra ligeiramente na parte final, mas isso é pouco
diante de um painel tão vibrante e intenso, cuja energia parece transbordar da tela e nos
indagar, a nós de hoje, sobre o que fazemos politicamente de nossas vidas.