Carnavalhame Edição 4 - Homenagem a Marcelo Yuka Carnavalhame Edição 4 - Homenagem a Marcelo Yuka | Page 6

Por Ithalo Furtado Idealizador da Carnavalhame MINHA ALMA: 21 ANOS DA CRÔNICA AUDIOVISUAL QUE DEFINIU A VIOLÊNCIA POLICIAL NO BRASIL DOS ANOS 90 Rio de janeiro. Vila Isabel. Morro do macaco. O ano é 1999 e o país ainda parece sofrer de algumas ressacas significativas como a perda da copa do mundo e o resultado das eleições presidenciais, todas no ano anterior. Os jornais começam a alertar sobre um tal bug do milênio que apareceu como um registro quase apocalíptico para a virada do século num tempo em que o uso da internet ainda era quase ficção. A MTV começa a transmitir, alucinadamente, um clipe protagonizado pela atriz Mariana Ximenes onde quatro barbudos bradavam o nome de uma mulher que nunca mais deixaria de fazer eco na música brasileira. O recém criado Real é desvalorizado, o futebol mundial conhece Ronaldinho Gaúcho, Central do Brasil é indicado ao Oscar e o estudante Mateus da Costa Meira invade uma sessão do filme Clube da Luta no Morumbi Shopping e metralha o público, instaurando um pânico semelhante ao recente massacre de Columbine. É nesse cenário que Marcelo Yuka estaciona o carro e se apressa para mais um ensaio do Rappa, às vésperas da gravação do novo disco da banda. Ele levava uma composição nova, algo que sentia ter uma força diferente. Chegando ao ensaio, viu que tinha perdido o manuscrito e avisou que iria ao banheiro. Foi ao carro e constatou a perda. Então, no banheiro, reescreveu o que lembrava da letra original, numa versão bem mais sintetizada. Saiu de lá e apresentou à banda, achando que estava “uma merda”, que a original era bem melhor. Alguns meses depois, o Brasil assistiria abertamente na TV o que até então era apenas sussurrado pela imprensa: a violência policial nas periferias do Rio de Janeiro estava dizimando a população mais pobre. Dirigido por Paulo lins e Kátia Lund, o clipe de Minha alma (a paz que eu não quero) ganhou não só os principais prêmios do ano, mas o público, a crítica e os veículos de comunicação. E toda essa repercussão o alçou ao posto de principal produção artística brasileira do final dos anos 90, a confusa e violenta década da redemocratização do país.