Carnavalhame Edição 4 - Homenagem a Marcelo Yuka Carnavalhame Edição 4 - Homenagem a Marcelo Yuka | Page 18
ALEX
SAMPAIO
Teresinense, nascido em 1987. Bacharel
em Direito. Atualmente é servidor
público. Colaborador em coletivos
culturais. Teve textos publicados em
jornais, blogs e portais. Autor dos livros
“O manipulador: memórias de um
falso poeta” (premiado pela Fundação
Cultural Monsenhor Chaves, por meio
do concurso Novos Autores, 2010, não
publicado) e “Ressuscito na cidade
suicida” (2017).
O DIABO É
BRASILEIRO
Faltou luz mas era dia. Passei o dia de ressaca
enquanto o Brasil incendiava. Nem a cerveja gelada
na esquina espantou o mal. Fumaça. O diabo é
brasileiro. Bebi muita água. O dia foi muito quente.
Liguei o ar-condicionado e deitei um pouco. No
início da noite, dormi sem perceber. Acordei com o
barulho da chuva. Os relâmpagos davam espasmos
de luz dentro do quarto. Levantei da cama. Comecei
a ler um romance. Foram oitenta páginas lidas até
a chuva acabar. Parece que existe uma doença no
mundo. Choveu por duas horas uma vacina. A boca
da terra tomou o remédio das nuvens, a
conta-gotas. Eu sei que não veio a cura. Imagino
os bueiros vomitando esgotos; os asfaltos das
ruas febris, suados; as poças d’água nas avenidas
esmagadas pela velocidade dos carros; os rios
fedendo. A chuva não lavou. A cidade ainda é suja.
Lindamente suja. Ontem fui beber porque estava
triste pelo Brasil. O diabo é brasileiro. Não era
comemoração de nada. Pelo contrário. Só não
queria ficar em casa. Só queria me distrair. Precisava
tomar fôlego. Estava afogado em notícias ruins. Bebi
demais. Parece que existe uma doença no mundo,
ou na gente. Passei o dia de ressaca.