atómica fevereiro de 2024 | Page 32

É durante a infância que as crianças são mais recetivas a aprendizagens, ocorrendo a maior parte do desenvolvimento neurológico com a formação de sinapses e conexões dos neurónios, ampliando a capacidade cerebral. A exposição precoce à música, além de facilitar a emergência de talentos ocultos, contribui para a construção de um cérebro biologicamente mais conectado, emocionalmente competente e criativo. Crianças em ambientes sensorialmente enriquecedores apresentam respostas fisiológicas mais amplas, maior atividade das áreas associativas cerebrais, maior grau de neurogénese (formação de novos neurónios em áreas importantes para a memória) e diminuição da perda neuronal (apoptose funcional). A educação musical favorece a ativação dos chamados neurónios em espelho, localizados em áreas frontais e parietais do cérebro, e essenciais para a chamada cognição social humana, um conjunto de processos cognitivos e emocionais responsáveis pelas funções de empatia, ressonância afetiva e compreensão de ambiguidades na linguagem verbal e não verbal.

Existem muitas outras situações onde se reconhecem os benefícios da música.

Os adolescentes da era digital sobreestimulam o cérebro automático mas ficam privados de experiências relacionais que envolvem vínculo afetivo e empatia. No período da adolescência ocorrem mudanças hormonais e também neurobiológicas, como o aumento da substância branca, a diminuição da substância cinzenta neocortical e a perda de um terço de neurónios dopaminérgicos. Tais alterações condicionam uma maior impulsividade, agilidade motora e períodos de humor oscilante. A música pode facilitar respostas emocionais mais positivas. Nos indivíduos com demência, verifica-se que a aptidão e apreciação musical permanecem intactas ou só são afetadas tardiamente. Nestes casos, a música facilita a ativação de redes neurais altamente plásticas, evocando emoções e recuperando memórias autobiográficas. Os benefícios proporcionados pela música, são ainda extensíveis a pessoas com transtornos ou disfunções do neurodesenvolvimento, como o défice de atenção e a dislexia e até transtornos neuropsiquiátricos como autismo, depressão, esquizofrenia.

Perante o exposto, compreende-se a importância que atualmente se atribui à música. No entanto, os seus predicados já eram reconhecidos na Grécia Antiga pelos filósofos. Para Platão, “… A música é uma lei moral. Ela dá alma ao universo, asas à mente, voo à imaginação… “, já segundo Aristóteles, “… A música tem o poder de formar o caráter e, portanto, deve ser introduzida na educação dos jovens …”. Mas, independentemente de compreendermos os complexos circuitos cerebrais ou aceitarmos as ideias dos antigos filósofos, será fácil referir em uníssono com Friedrich Nietzsche que “… Sem a música a vida seria um erro…”.

Glossário:

Consonância - Concordância de sons. Ocorre quando duas notas tocadas juntas apresentam uma sensação de conformidade nos sons.

Dissonância - Discordância de sons. Ocorre quando há um choque entre notas, causando uma sensação de conflito, de disformidade.

Dopaminérgicos –   Estimula a libertação ou a produção de dopamina.

Neuromodulação - Alteração da atividade dos nervos por meio de estímulos direcionados a áreas neurológicas específicas do organismo.

Sistema nervoso vegetativo - Porção do sistema nervoso que atua, independentemente da vontade, do encéfalo e da medula espinal, regulando as funções vitais e as secreções dos órgãos internos.

Substância cinzenta - Componente do sistema nervoso central, responsável por interpretar os impulsos nervosos das várias regiões do corpo até ao encéfalo, produzir impulsos e coordenar atividades musculares e reflexos.