1. As fatídicas primeiras 24 horas
As primeiras 12 horas serão o primeiro obstáculo de quem se quiser submeter ao desafio por mim proposto, pelo simples facto da ausência do telemóvel ativar uma resposta nervosa, através da libertação de uma hormona – cortisol – associada ao stress e à ansiedade. Assim, estas horas serão desafiantes pela constante resposta ansiosa do cérebro, vendo-se na ausência de um estímulo recorrente que, de repente, desaparece. Se conseguir ultrapassar este período de alto nervosismo e ansiedade, estará equipado para prosseguir com a viagem e prolongar o absentismo do seu telemóvel por 24 horas. As 24 horas são designadas pelo FOMO, do inglês fear of missing out, que corresponde a um medo constante de perda de oportunidades, tanto de entretenimento como sociais. Combinado com o aumento do nível de stress experienciado na primeira etapa do detox telefónico, o leitor sofrerá também de um ligeiro aumento na frequência cardíaca, bem como pressão arterial mais elevada. Espantoso o que uma desintoxicação é capaz de fazer ao organismo humano, não é?
2. O terceiro dia, e a dor fantasma
Já deve ter ouvido falar da dor fantasma, mas, caso não tenha, é uma dor que comumente afeta um membro amputado. Claro que isto é um hiperbolismo, não está mesmo a sentir dor fantasma, mas no terceiro dia pensará que o seu telemóvel está a tocar ou a vibrar quando, efetivamente, não está. Não obstante, é também no terceiro dia que se dará início a uma verdadeira alteração no seu ser. Começará a reparar que a sua concentração atinge níveis nunca vistos e que presta mais atenção ao que se passa em seu redor. Sim, não terá a gratificação instantânea que o telemóvel lhe oferece, mas será recompensado pela sua família e amigos, e por viver no presente.
3. Atenção ao dia cinco
Por volta do dia cinco, deverá reparar que concentrar-se em tarefas, quer no emprego, quer na escola, se tornou bastante mais fácil. Um estudo feito a estudantes universitários que utilizam os seus telemóveis incessantemente expôs que são apenas capazes de se concentrar numa tarefa por 65 segundos, apenas mais um bocadinho que um minuto. Outro estudo realizado a trabalhadores num escritório revelou que aqueles que mantinham o seu telemóvel ligado ao longo do dia conseguiam concentrar-se na tarefa em mão não por mais do que 3 minutos. No entanto, um estudo realizado na Universidade de Carnegie Mellon, na Pensilvânia, EUA, com 136 alunos, mostrou uma diferença significativa no desempenho dos estudantes num teste: em média, os estudantes que tinham os telemóveis ligados tiveram um desempenho 20% menor que aqueles com os telemóveis desligados. O nosso cérebro é capaz de dar a sua máxima atenção a uma tarefa de cada vez. Se o obrigamos a mudar o seu foco com frequência, não é capaz de fazer a transição eficazmente, e os níveis de atenção disponibilizados são, consequentemente, menores. Cinco a sete dias após iniciar a desintoxicação, a cognição continua a melhorar, como demonstra ainda mais um estudo realizado a 660 indivíduos, que veio provar que, quanto menos horas o participante passava ao telemóvel, mais fortes eram as suas habilidades cognitivas. Não vou tão longe como dizer que pessoas que utilizam menos os telemóveis são mais inteligentes. Todavia, é o que o estudo sugere. Sim, também me magoou o ego, não se preocupe, caro leitor. Não é o único.
4. Uma semana, e dorme como um bebé
Uma semana após iniciar o desafio, poderá constatar que dorme um sono mais profundo e com menos interrupções. Há muitas teorias e tentativas para explicar a melhoria no sono. Qual será a teoria mais acertada? Não há ainda forma de saber. Quiçá um dia. As únicas evidências de que os telemóveis realmente afetam o sono baseiam-se em estudos e inquéritos, embora o porquê exato não seja ainda conhecido. Acredita-se que a luz azul emitida pelos ecrãs dos telemóveis diminui a libertação de melatonina, a hormona do sono. A melatonina tem um papel fundamentar no ritmo circadiano (variação nas funções biológicas de diversos seres vivos, que se repete regularmente com período de aproximadamente 24 horas), atuando com o cortisol. O cortisol, que atua como um sinal de alerta (daí ser responsável pela ansiedade sentida nos primeiros dias sem o seu telemóvel), mantém-nos alerta durante o dia, mas diminui a sua ação ao cair da noite – altura do dia na qual o organismo liberta melatonina e ativa o sono. Ao diminuir-se a secreção de melatonina, está-se ativamente a aumentar as dificuldades para adormecer, bem como a qualidade do sono. Portanto, se reparar que dorme melhor sem ter o telemóvel ligado ao seu lado, com a luz a incidir-lhe no rosto, agora tem uma noção do impacto da luz no seu cérebro. Quer dormir bem? Tente desligar o telemóvel.
5. Deixe passar uma quinzena, sentir-se-á menos ansioso
14 dias depois de se auto desafiar a ficar sem telemóvel, a ansiedade que inicialmente sentiu sofre uma diminuição notável e, curiosamente, verifica-se que em determinados casos, pode atenuar outras doenças psicológicas, como a depressão. Aliás, adolescentes que passam cerca de cinco horas diárias no telemóvel são 71% mais propensos a sofrer de algum tipo de tendências suicidas e depressão, face aos adolescentes que passam, em média, uma hora diária ou menos ao telemóvel. Após duas semanas, notará de igual modo que sintomas físicos, como dores de pescoço ou dos pulsos, se atenuarão. Só sai a ganhar!
Assim, deixo-o, caro leitor, com todos estes dados e estudos. E também com um bocadinho da ciência por detrás do seu hábito terrível de pegar no telemóvel cada vez que tem de esperar 20 minutos pela sua refeição num restaurante.
Quer aceitar este desafio e passar 15 dias sem um telemóvel? Cabe-lhe a si decidir. ■