Cracolândia: ação na região reabre debate sobre tratamento de dependentes químicos
A retirada dos usuários de crack da região conhecida como Cracolândia, no centro de São Paulo, em maio, colocou novamente em foco as políticas públicas de tratamento para dependentes químicos.
A ação, organizada em conjunto pelo Governo do Estado e pela Prefeitura da cidade, visava desarticular o tráfico na área. A megaoperação envolveu mais de 900 agentes da polícia.Armas foram detidas, houve retirada de barracas e cobertores dos moradores de rua, imóveis foram demolidos e há relatos de pessoas serem surpreendidas com bombas de gás e balas de borracha.
A forte repressão à região foi criticada por muitas organizações por tratar como caso de polícia uma questão que seria de saúde pública. Nessa visão, o ideal seria tentar cuidar do usuário dependente.
Houve quem considerasse a opção de Doria uma medida higienista, que buscaria “limpar” a região em um projeto de reurbanização para que moradores, trabalhadores e comerciantes pudessem ter um bairro mais seguro.Como consequência direta, a ação acabou dispersando os usuários de drogas para ruas próximas e criou novas Cracolândias na região, como a praça Princesa Isabel.
Para a prefeitura, o dependente não deve ficar próximo a áreas de consumo e venda. A nova gestão municipal criou o projeto Redenção e encerrou o programa Braços Abertos, da gestão Haddad, que atuava com redução de danos e visava diminuir o uso de drogas e a vulnerabilidade social do usuário, a partir da melhoria das condições de vida, com empregos e moradia em hotéis da região. Sem os hotéis, muitos usuários foram parar na rua. A prefeitura alega que agora eles poderão ficar em casas de recuperação e abrigos sociais, como o Complexo Prates, que prevê ações de saúde pública para o tratamento aos usuário
O crack é uma droga mais potente do que a cocaína e de alto poder viciante. Ela é composta de pasta de cocaína misturada a bicarbonato de sódio ou amônia e é vendida na forma de pequenas pedras que são fumadas em cachimbos.
A droga surgiu nos Estados Unidos nos anos 1980 e se popularizou no Brasil na década seguinte
Por ser mais barato que a cocaína, dispensar seringas e ter uma produção doméstica, o crack se espalhou rápido tanto nas zonas urbanas quanto nas rurais, entre as classes mais pobres e as com maior poder aquisitivo.
No Brasil, São Paulo não é a única cidade a lidar com o problema. O crack está presente em 98% dos municípios brasileiros. O país representa 20% do consumo mundial de crack e é o maior mercado da droga no mundo. De acordo com a Pesquisa Nacional sobre o Uso do Crack, divulgada em 2014, 370 mil pessoas usam a droga regularmente.
A pesquisa foi conduzida pela Fiocruz e mostra que, embora a percepção geral seja a de que na região Sudeste o consumo do crack seja maior, a realidade mostra que as regiões Nordeste (1,29%) e Sul (1,05%) têm a maior proporção de consumo da droga. O menor consumo é, na verdade, na própria região Sudeste (0,56%).
O estudo também traçou um perfil do usuário de crack no país: a maioria é homem (78,68% contra 21,32% de mulheres); nas capitais, 77,73% dos usuários se autodeclaram negros ou pardos; 57,60% têm o ensino fundamental e apenas 2,35% têm ensino superior. Ainda segundo o levantamento, as fontes de renda relatadas pelos usuários são o trabalho esporádico ou autônomo (65%), pedir esmolas (12,8%), empréstimos e/ou presentes (11,27%) e a prostituição.
Devido à situação do uso da droga no país, em 2011 o governo federal lançou o “Crack, é possível vencer”, o primeiro programa nacional de combate ao consumo do crack em cidades com mais de 200 mil habitantes. No entanto, os municípios reclamaram que as verbas não foram repassadas pelo governo para colocar as ações em prática, comprometendo todo o projeto. O programa pretendia criar 2.460 leitos para atender usuários em tratamento. Apenas 800 foram criados. Dos 308 consultórios de rua que foram propostos, apenas 129 foram criados.
O crack no Brasil e quem é o usuário