As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 42

Falhas e fragilidades Com o discreto retorno da inflação, pressionada pelos elevados gastos públicos e pela desvalorização do real frente ao dólar, ficaram mais claras as limitações do modelo econômico. O governo passou a ser cobrado por não conseguir fazer o país crescer e por não conseguir conter a inflação. O horizonte da disputa eleitoral de 2014, com o anúncio precoce de que a presidente seria candidata à reeleição, fez com que a insatisfação e as tensões políticas aumentassem, enfraquecendo a base parlamentar do governo e comprometendo, assim, sua capacidade de ­resposta política. Bastou uma pequena avalanche de aumentos (alimentos, bens de consumo, serviços e transportes) para que o equilíbrio se rompesse. Aos poucos, foram se evidenciando os problemas e ruídos que o modelo conseguira administrar até então: a desigualdade, a distância entre as classes sociais, a persistência da corrupção, o desperdício público, a má qualidade das respostas governamentais e das políticas públicas, o reduzido espaço para a participação política, a ausência de políticas para os jovens, o vazio programático dos partidos, a ruindade do debate público democrático e das disputas eleitorais, as alianças políticas sem critérios. O que aparentava estar adormecido, ou que pulsava em pequena escala – micromanifestações, indignações virtuais, greves localizadas –, irrompeu à luz do dia e em grande escala. Do final dos anos 1990 em diante, o PT foi eficiente na demonstração de que ele era a “esquerda possível” no Brasil, aquela permitida pela correlação de forças e que promoveria, por dentro do capitalismo em franca reprodução, algumas transformações sociais importantes. Com isso, Lula e o PT praticamente monopolizaram o campo das esquerdas brasileiras, empurrando todas as demais propostas ou para o “centro” e a letargia, ou para a retórica esquerdista. Fizeram isso, porém, 40 As ruas e a democracia