As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 184

é seu amigo e sempre faz mídia favorável ao governo, mas que também recebe Aécio, que diz que não é inimigo de Lula. FHC escreve no Estadão não por ter sido poupado de críticas, mas porque é um dos grandes intelectuais do país, além de ex-presidente. Lula escreve no NY Times. Julgar a mídia por seus posicionamentos políticos, por suas ênfases parciais ou unilateralidades é como falar mal da chuva: pode acalmar e direcionar a raiva, mas não faz com que a chuva pare. Mídias podem ser empreendimentos públicos (estatais) ou empresas privadas que têm funções públicas ou podem tê-las. Todo jornal é instrumento de seus proprietários: podem ser famílias, aristocratas, reacionários, governos, banqueiros ou partidos políticos. Todo jornal é veículo de luta por poder e por hegemonia. Todo jornal difunde a concepção de mundo de seus proprietários, acionistas ou sustentadores. Jornais escolhem campos e por isso formam leitores e seguidores. Impõem suas visões, e esperamos que façam isso sem violência, de modo civilizado, inteligente e publicamente responsável. Agindo assim, comportam-se democraticamente sem ter de abrir mão de opinião, valores, ideologias e interesses. Quando informam com honestidade, garantem a circulação de informações, criticam os governos, desnudam os podres poderes e impulsionam o debate democrático, cumprem funções públicas decisivas. Canais de rádio e TV, que são os mais influentes, atuam por concessão ou autorização pública, e isso faz enorme diferença. Não só porque, em última instância, o cidadão é o “proprietário” deles, mas também porque no processo mesmo da concessão podem surgir ruídos que impedem a adoção de critérios justos e democráticos. A concessão pública, porém, não impede que os veículos funcionem de modo comercial, vinculado unilateralmente ao mercado, ou agindo conforme conveniências ideológicas e políticas. A sociedade deveria conseguir isso, mas não consegue. Como tudo, nos dias atuais, se converteu em mercado, seria estranho que os veículos de comunicação social fossem 182 As ruas e a democracia