Andamento #1 Conservatório de Música de Sintra | Page 66

que me bloqueou ; no jazz eu sei que acordes é que tenho que tocar , mas a decisão está a ser tomada em tempo real , não há a ideia de erro . Talvez haja no solo , mas como é improvisado posso decidir como solucionar o erro do solo , pode não ser claramente um erro visto de fora , ninguém conhece o meu solo . Essa tomada de decisão em tempo real foi o ponto de partida para mim do início do desbloqueio . Depois disso a questão foi levar esse raciocínio para algo que já estava definido anteriormente . Para mim isso passou por um livro muito específico que se chama The inter game of Music ( ver caixa ).
Antes quando estava a tocar pensava ativamente em acertar e no que é que as pessoas estariam a pensar .
AA : Isso criava-te ansiedade . IL : Claro , e mais do que isso : é impossível fazer música se estás a pensar assim . A partir do momento em que , também com a ajuda do meu professor de clássico , me comecei a focar na interpretação e não nas notas , passei a acertar as notas , houve uma diferença enorme . O mesmo aconteceu em relação ao jazz : quando parei de pensar se o meu solo estava a ser bom ou não enquanto estava a tocá-lo , e simplesmente ouvia a música e pensava só em música , os meus solos ficaram logo muito melhores , portanto acho que há aqui um lado consciente . Teria feito este processo se não tivesse passado pela improvisação ? Provavelmente não .
AA : Muito obrigada , Inês . IL : Obrigada eu pela entrevista , por poder dizer estas coisas que são muito importantes para mim . Fico contente que haja mais pessoas preocupadas com estas questões . É preciso mudar o que precisa de ser mudado , e acho que temos todos a ganhar , alunos , professores , músicos e público , em pensar de forma um bocadinho diferente .
“ Originalmente foi escrito o The inter game of Tennis que fala sobre o jogo interno , sobre o jogo mental por detrás do jogo de ténis . Qualquer pessoa que jogue este tipo de jogos individuais sabe que tendemos a ganhar vários pontos de seguida ou a perder vários pontos de seguida , o que tem a ver com a forma como o cérebro afeta a nossa performance . Houve um músico , o Barry Green , que foi ter com o autor do The Inner game of Tennis e associou-se a ele para escrever o The inter game of Music porque achou que havia um paralelo entre as duas coisas . A nossa performance musical é afetada pela forma como o nosso cérebro pensa nisso e então o autor faz uma equação que é : a nossa performance é igual ao potencial menos a interferência que nós permitimos que aconteça . Portanto se tivermos um potencial de 100 e uma interferência de 90 a nossa performance vai ser um 10 , o que não quer dizer que valemos um 10 , quer dizer que estamos com interferência a mais . A partir do momento em que comecei a pensar nisto , comecei a fazer exercícios conscientes , ou seja , a tomar a decisão consciente de ignorar essa interferência , não ligar , não ouvir , não interessa o que é que as pessoas estão a pensar ”.
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