Andamento #1 Conservatório de Música de Sintra | Page 13

Já todos nós , certamente , ficámos tocados com alguma atuação de um ator ou atriz , que aos nossos olhos , foi incrível - quer seja num filme , numa peça ou até mesmo numa série . Já todos nós nos identificámos com alguma personagem ; já olhámos para a televisão e pensámos “ eu passei exatamente pela mesma coisa ” ou assistimos a uma peça que nos fez refletir sobre o quanto nós gostávamos de ser capazes de sentir ou de viver o mesmo que aquela pessoa . É inevitável . E é por isto que eu acredito que não há uma única pessoa que assista a algo que faça parte desta arte e fique indiferente ; todos nós saímos de alguma forma mais elevados , mais fortes , e com aquela vontade que muitas vezes nos falta para termos a coragem de olhar para a vida com outros olhos . E não é preciso fazer efetivamente parte deste mundo para sentir esta mudança dentro de nós – tantas pessoas que não partilham deste “ bichinho ” do teatro , que sentem não ser capazes de atuar ou de viver a vida na pele de outra pessoa , mas que não negam a magia que sentem no lado da plateia ou o facto de que , por vezes , ver alguém que ama aquilo que faz a ser capaz de concluir uma atuação onde se concretizou e mostrou um trabalho imenso , é também suficiente para que ela própria se sinta satisfeita e realizada - talvez apenas porque teve o privilégio de presenciar algo tão bonito . E é isto que faz do teatro uma arte tão pessoal , tão única ; onde os olhares nos tocam , as palavras nos despem e a presença de uma única pessoa faz toda a diferença . Porque é isto que o público sente quando se identifica com algo – sente que foi feito para ele ; que aquelas palavras estavam destinadas a ser ouvidas por aqueles ouvidos , que pertencem àquele corpo , que já por tanto passou – e é essa a função do teatro . Confortar esse corpo . Criar essa intimidade e perfurar o coração de todos aqueles que se sentam na plateia , fazendo-os acreditar que aquelas palavras foram de facto escritas para serem ouvidas por eles ; que aqueles olhares não teriam aquele brilho se eles não estivessem ali sentados . E é esta a magia do ator : criar esta tão grande conexão com pessoas que muitas vezes nunca viu ; fazê-las sentir coisas que de outra forma não sentiriam ou pensar sobre assuntos que nunca as perturbaram - e sempre pelas palavras de outra pessoa , pelos olhos de outra pessoa . E é uma tarefa tão difícil , tão desafiadora , conseguir tornar real aquilo que muitas vezes nunca passou de imaginário ; conseguir criar uma vida apenas através daquilo que vemos no papel . É todo um percurso , que nos prende , nos vicia , nos magoa e nos faz pensar , mas acima de tudo , nos ensina tanto … Porque um ator , para mostrar aquela vulnerabilidade em palco e criar a ligação , que é tão bonita , com o público , tem de pensar em tudo aquilo que mais ninguém pensa : tem de saber como é que a personagem respira , como é que anda , o que é que pensa , porque é que pensa assim , pelo que é que passou , o que é que a fez ser como ela é , para poder criar uma realidade , que não passando de uma ilusão , seja o mais verdadeira e genuína possível . E é tão viciante esta coisa de ser outra pessoa ; de sermos capazes de nos desligar de tudo à nossa volta e ceder o nosso corpo e a nossa mente a uma verdade que , apesar de não ser nossa , nos pertence e nos possui como mais nenhuma , quando subimos ao palco . E é essa a busca do ator : encontrar essa verdade , escondida nas entrelinhas de
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