extensão, à própria desintegração social. Surge um moderno
tribalismo em algumas áreas do Globo. Penso que cada comuni-
dade deveria se encarregar, internamente, de divulgar e cultivar
suas especificidades culturais, sem que para isso renuncie à
comunidade maior, de caráter mais universalizante, cosmopolita.
Uma espécie de duplo patriotismo cultural poderia se formar
então, apresentando-se como uma opção tanto ao assimilacio-
nismo quanto ao isolacionismo. Uma coisa é ser parte de uma
luta; outra, muito diferente, é ser uma luta à parte.
• A cultura surge da observação da vida em toda sua pleni-
tude. Por exemplo, se o exame do ambiente histórico ajuda a
entender o comportamento religioso, o mesmo pode ser dito em
relação ao próprio ambiente natural em que o homem se insere.
O povo judeu, como sabemos, foi forjado no deserto, sujeito a
frequentes tempestades de areia. Daí talvez o Antigo Testamento
destacar que "dentre todas as obras de Deus nada é mais desco-
nhecido para qualquer povo do que o rastro do vento".
• Como que para provar que a imaginação dos artistas não
tem a realidade por limite, Pablo Picasso desenhou o retrato do
seu primeiro filho antes mesmo que ele nascesse. Por essas e por
outras é que a Arte é o último reduto das práticas mágicas no
mundo contemporâneo.
• Pode parecer um paradoxo mas não é: o silêncio é indispen-
sável à construção das palavras. A literatura, como a prece, pede
recato e recolhimento. Depois, grita.
• Em matéria de literatura, tomar partido nunca é o melhor
caminho para alcançar seus objetivos. Quanto menos o autor
interfere, mais o texto tem a possibilidade de se sobressair.
A trama deve falar mais alto. A qualidade artística conscientiza
mais do que qualquer panfleto.
• Não se pode confundir realismo e descrição sociológica em
um texto de ficção. Pois há realismo também na dimensão psico-
lógica das personagens do enredo. Mestre Ariano Suassuna foi
direto ao ponto: " uma das melhores maneiras de trair a realidade
é ser-lhe fiel de modo estreito".
• Sobre o peso da literatura: "eu vou morrer e a puta da Bovary
vai continuar a viver", teria dito Gustave Flaubert, quando sentia
a proximidade da morte.
• A Teologia é a estética de Deus.
Notas Culturais II
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