1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 78

FAZER AS MUDANÇAS NA DEMOCRACIA, UM DESAFIO Sergio Augusto de Moraes1 U ma das questões que o golpe de 1964 colocou de maneira dramática para a esquerda brasileira foi a da defesa da democracia. Não de algo estático, de uma democracia que não altera a correlação entre quem perde e quem ganha, mas sim daquela que vivemos à época, sob a qual se faziam mudanças em ritmo acelerado a favor das camadas populares. Nessas condições, os interesses em conflito vêm à tona, as forças se polarizam e os prejudicados, no caso as elites conservadoras, tentam mudar o cenário de uma ou outra maneira. Em 1964 eles resolveram fazê-lo pela força, sem esperar as eleições previstas para poucos meses depois. Tal reação não era de estranhar caso se levasse em conta a tradição brasileira, coalhada de golpes e quarteladas. O que foi estranho e muitos se perguntam até hoje é como as forças populares e o governo Jango não conseguiram esboçar uma reação séria ao golpe, preservando a legalidade democrática; particularmente tendo em conta a experiência dos anos anteriores, mais precisamente a do episódio de 1961, ocasionado pela renúncia de Jânio Quadros à Presidência da República. Nesta oportunidade, os setores mais conservadores tentaram interromper o processo constitucional mas as forças populares e democráticas conseguiram evitar o golpe, garantir a posse de Jango na Presidência da República – mesmo com poderes reduzidos pela emenda parlamentarista – e preservar a continuidade 1 76 Engenheiro e mestre em econometria pela Universidade de Genebra, Suiça. Foi membro do Comitê Central e da Comissão Executiva do PCB, de 1982 a 1990.