1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 48

CRISE DE PODER E ESPOLIAÇÃO DA DEMOCRACIA José Antonio Segatto1 O movimento político-militar que desfechou o golpe de Estado que, por sua vez, destituiu o governo democrático constitucional da República, em abril de 1964, e seus desdobramentos históricos (regime de exceção instituído sob a forma de ditadura), já foi objeto de incontáveis análises e estudos, apreciações e julgamentos – tendo sido publicado um número incalculável de artigos, teses, livros, além de reportagens e entrevistas, memórias e depoimentos. No intento de explicá-lo, justificá-lo ou desaprová-lo, produziu-se um considerável e diversificado acervo bibliográfico e documental, tanto de natureza científica e/ou acadêmica, política e/ou ideológica, quanto jornalística e memorialística. Bastante heterogêneo nos fundamentos, entendimentos e concepções que o informam, é composto de explicações as mais discrepantes e dessemelhantes possíveis. As muitas avaliações e interpretações, não obstante fornecerem, muitas vezes, elementos e subsídios fundamentais e constituírem-se em contribuições necessárias e relevantes par a a compreensão daquele momento crucial, não esgotaram totalmente o problema histórico-político do golpe de 1964. Hoje, meio século passado, é necessário não só rever determinadas interpretações, como fazer uma profunda reflexão sobre esse momento crucial da história brasileira – o pretérito insiste em continuar atormentando e mesmo cerceando 1 46 Professor Titular do Departamento de Sociologia da Faculdade de Ciências e Letras, da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), campus de Araraquara.