1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 340
lidade brasileira. O manifesto assinado por cientistas e intelectuais
europeus pedindo a libertação do professor Schenberg teve entre
seus signatários Werner Heisenberg, Nobel de Física. O professor
José Leite Lopes, físico de renome internacional, teve negado seu
pedido de concessão de passaporte e, logo em seguida, foi preso
numa cela comum do DOPS. Como o absurdo, se aceitas as lições de
Ionesco, Beckett & cia, não implica obrigatoriamente a ausência de
humor, em especial quando o ridículo se faz presente, o Correio da
Manhã, de agosto de 1964, noticiou o caso de uma advogada de
Brasília chamada a depor perante as autoridades militares. Indagada por um major se era comunista, ela negou peremptoriamente
que o fosse. Mas, insistiu o inquiridor/inquisitor: “se não é comunista, como explica ter ido em tal data à Rússia?”. Advogada: “Todo
2 de novembro vou ao cemitério e, no entanto, não sou defunta”...
Como momentos politicamente infamantes estimulam atos
de vilania, propiciando a cada um a chance de revelar sua verdadeira face, o professor João Alfredo, que renunciou à reitoria da
Universidade do Recife, rebatia os ataques que vinha recebendo de
“setores recém-convertidos à democracia, especialmente o sociólogo Gilberto Freyre”, a quem acusou de delatar professores
daquela universidade, conforme noticiado na edição de 16 de junho
de 1964 do Correio da Manhã. Por seu lado, Eugênio Gudin, ministro da Fazenda do governo Café Filho, escreveu que a defesa do
direito a uma vida digna para todos os seres humanos era “proposição digna de um asno porque é absurda”. Essa infração ao bom
senso, para o dr. Gudin, era uma dessas “asneiras” patrocinadas
pela “ala comunista do catolicismo”...
Nesse contexto, torna-se perfeitamente compreensível que
os militares no poder tenham encontrado elogios às suas ações
entre figuras como Robert Welch, o então líder da John Birch
Society, organização de extrema direita norte-americana ainda em
atividade e que combate tudo o que remotamente tenha alguma
ligação com o comunismo.
Enquadrado no “crime de delito de opinião” e réu de um
IPM comandado por um major, instaurado para investigar 2F