1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 339
de Melo, era alvo da atenção dos militares, ansiosos por enquadrar
o religioso como “subversivo”. A Justiça Militar do estado de São
Paulo denunciava vários professores universitários e pedia prisão
preventiva para alguns deles. Um grupo de pesquisadores do
Museu Goeldi, no estado do Pará, estava sob investigação. O futuro
sociólogo, então estudante da USP e mais tarde um dos fundadores
da Polop, Éder Sader, foi acusado pelo simples fato de ter feito
palestras em um sindicato. Dirigentes e membros de Diretórios
Acadêmicos eram presos, caso, para citar um só exemplo, de
Oscarlino Marçal, da Faculdade de Direito da USP e presidente do
Centro Acadêmico XI de Agosto, recolhido ao Dops por ordem do
coronel que presidia o Inquérito Policial-Militar (IPM) naquela
unidade universitária. Uma comissão de estudantes da USP se
mobilizava para saber a sorte dos professores Mario Schenberg,
Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, João Cruz
Costa, João Villanova Artigas e Isaías Raw, todos catedráticos e
sobre os quais pairava a ameaça de demissão. Instalou-se um IPM,
no Instituto Tecnológico de Aeronáutica, inquérito cujas provas
sustentando a acusação de subversão da ordem social naquele
estabelecimento de ensino eram uma lata de pêssego, uma de
sardinha, um exemplar de O idiota, de Dostoiévsky, e outro do
suplemento literário do Correio da Manhã. A Sociedade de Biologia, grupo de pesquisa de São Paulo, teve seus trabalhos interrompidos com a prisão de um de seus membros, o professor B. B.
Vargaftig. Alegando cumprir ordens superiores, mas sem revelar
de quem, dois oficiais do Exército invadiram a casa de Álvaro Lins,
renomado crítico literário e intelectual dos mais destacados de seu
tempo, devassando, por horas, sua biblioteca, de onde retiraram,
entre outros ítens, um livro de Ferreira Gullar, obra que os militares consideraram “pornográfica”.
Nem mesmo intelectuais brasileiros com destaque no exterior
escapavam da fúria persecutória do regime. Oscar Niemeyer, Mario
Schenberg e Celso Furtado eram alguns desses nomes ilustres, citados os três no Congresso pela Liberdade da Cultura, em Paris, que
publicou um documento no qual descrevia a situação da intelectuaMemórias de um tempo de barbárie
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