1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 255
grau de autonomia, ainda que estrategicamente limitado a autorizações externas. Era um boom econômico artificial, que paradoxalmente freava a ação política. Os dirigentes da esquerda armada
decodificaram desastradamente esse novo estágio do capitalismo
brasileiro, como também o atacaram burramente, ao não entender
o seu novo caráter e as suas inserções no cenário internacional.
A preferência ou não das armas no campo da esquerda teria que
ser algo mais que meramente uma aventura armada contra o
Estado militar-nacional.
A práxis revolucionária (armada e política) foi sucessivamente limitada pela imprecisão dos seus alvos. Os revolucionários
tinham a crença de que haveria uma adesão suficiente da sociedade à resistência armada, e que ela seria espontânea. Tal colagem
nunca ocorreu. Ao não ter o seu ideário socialmente se disseminado, os vínculos possíveis das organizações com a sociedade
sempre foram etéreos. Falharam os seus teóricos na produção de
signos inteligíveis? Não houve ajustamento da sua linguagem, nem
enquadramento de suas ações (no sentido de interpretar e fazer-se
crer) para a sociedade? As escolhas que transitavam no seio da
sociedade não eram revolucionárias. Para as multidões, esse fenômeno não tinha nenhuma significância, já que era circunscrito
grupalmente no meio dos estudantes.
Os programas da ALN e VPR,11 réplica dos modelos cubano-vietnamita (ALN) e franco-argelino (VPR), exortavam um enraizamento popular que eles nunca conseguiriam no país. A esquerda
revolucionária era minoritária socialmente e insignificante militarmente. A consequência: os militares e seus aliados civis compa-
11 A VPR foi a segunda maior organização revolucionária do período 1968-1971. Formada por dissidentes da Polop (Política Operária) e antigos militares brizolistas
do MNR (Movimento Nacionalista Revolucionário). Seu principal fundador foi o
sargento do Exército, Onofre Pinto. A VPR se fundiu com o Colina (Comando de
Libertação Nacional), em um congresso realizado em julho de 1969, e formaram a
VAR-Palmares (Vanguarda Armada Revolucionária – Palmares). Essa fusão duraria poucos meses e as duas organizações voltariam a se separar pelas crises contínuas provocadas pelo capitão Carlos Lamarca em suas disputas com Onofre Pinto
pelo posto de comandante máximo.
Derrota anunciada: Luta armada e o PCB (1967-1973)
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