1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 243
sertão. Sem montanha ou floresta para se abrigar. Era o modelo a
ser seguido, que, mesmo quando dispunha somente de 150 homens,
os mantinha divididos em pequenos grupos e atribuía-lhes missões
específicas. Podiam evadir-se rapidamente das investidas das
volantes da Polícia Militar, muito mais numerosas e armadas;
outorgava liberdade aos chefes dos bandos para planejar ataques
ou retiradas. Aí está a raiz do planejamento mais grandioso da
ALN: guerrilheiros dispersos em pequenas unidades, que atacariam unidos, mas se dispersariam rapidamente, misturar-se-iam
ao povo nas áreas onde atuassem, camuflagem natural e a mais
segura. Calcado no modelo de contínua circulação do bando de
Lampião para fugir das perseguições das volantes policiais, todos
fariam parte do grande exército guerrilheiro, que se moveria de
cima para baixo na Rodovia Belém-Brasília, com grandes ações de
desgaste diretamente sobre o Exército.
Ao detalhar seus planos de guerrilha cangaceira para seus
companheiros de Agrupamento Comunista, temos um diálogo de
surdos com mudos. Estes criticam duramente Marighella. Isso era
tão somente um plágio, mais um dele e, como tal, farsesco. Como
nos informes triunfalistas de Antônio Maciel Bonfim (Miranda)
junto à IC, na caracterização feita sobre o cangaço, ele e outras
lideranças do Partido viam o cangaceiro como “potencialmente
revolucionário”. Os dirigentes do PCB desdenhavam: guerrilha
com retaguarda cubana (recursos e armas) não tinha a menor
chance. E ao se inteirarem do seu idílio militar com a guerrilha
cangaceira, não se preocuparam, pois era uma bobagem.6
Espelhando-se nas lições do passado, em certa ocasião Marighella debateu exaustivamente com oficiais comunistas da ativa
6
Um deles, Noé Gertel, que manteve contatos com Marighella mesmo quando este
caiu na mais estrita clandestinidade, relembra que lhe disse claramente: Cuba era
um pequeno país, sem fôlego e forças para manter um fluxo de recursos bélico e financeiro num país continental como o Brasil. Ademais, não haveria luta armada no
Brasil sem Prestes, dirigente do maior partido de esquerda que ressurgia das cinzas
e empunhara atraente bandeira: derrota pacífica da ditadura. O argumento final e
irretorquível: os soviéticos o tinham como seu representante maior no país (Cfe. entrevista em 20/05/1992).
Derrota anunciada: Luta armada e o PCB (1967-1973)
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