1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 208
passar pela mediação “suja” da política e sem se comprometer com
a ampliação da democracia. Tratava-se, também aqui, de uma
negação da política em nome da “pureza” dos movimentos sociais
e da pretendida “autonomia dos trabalhadores”. A lógica obreirista
comandou os passos do partido de forma implacável: a negação da
política, o desprezo diante da “questão democrática” e a recusa das
alianças explicam as decisões tomadas. Entre outras: a recusa em
participar do Colégio Eleitoral que pôs fim ao regime militar, em
assinar a Constituição de 1988 e em participar do governo Itamar
Franco (que tornou possível a implantação do Plano Real e a consequente eleição de Fernando Henrique Cardoso).
A mesma decepção vivida pela CUT repetiu-se no PT, quando
Lula, já presidente, declarou: “nunca fui de esquerda”... Um observador atento constatou com ironia: “... uma vez no poder, essa
esquerda “social”, avessa ao mundo maquiavélico da política, teve
de abandonar apressadamente suas veleidades rupturistas,
enquanto caminhava atrapalhadamente no sentido oposto, o da
adoção subalterna do programa adversário”.8
O desmanche
O movimento conhecido como neoliberalismo afirmou-se
mundialmente durante a crise da regulação fordista, em fins da
década de 60. As novas formas de acumulação do capital e de
gestão do processo industrial, para se firmarem, precisaram afastar o Estado das relações trabalhistas e quebrar a resistência do
sindicalismo. Iniciava-se assim a reestruturação produtiva e o
desmonte da rede de proteção social.
A concepção neoliberal, norteadora da ação anti-estatal,
encontrou sua formulação precisa numa frase de Margareth
Thatcher, a “dama de ferro”: “não existe sociedade, mas apenas
indivíduos”. Trata-se de uma concepção simetricamente oposta
àquela defendida outrora pelo positivismo. Enquanto este compre8
Luiz Sérgio Henriques, Uma pedagogia interrompida, Política Democrática, ano III,
n. 8, maio/2004, p. 24.
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