1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 161

era Juscelino Kubitschek. A partir desta redefinição, o regime de 1964 manteria intacto o sistema produtivo estatal, deslocando para a dimensão do mundo privado o tema do “liberalismo puro”, ao mesmo tempo em que intensificaria a intervenção do Estado na economia, objetivando acelerar o desenvolvimento como forma de superação do atraso econômico. Vista a partir da hipertrofia da modernização desencadeada desde a década de 1930, a diferenciação introduzida pelo regime de 1964 ficaria por conta da novidade dos processos societários que ensejava, em virtude da alteração promovida no interior da relação público-privado instaurada no processo da modernização brasileira. Em termos sintéticos: a dimensão pública, que incorporava a dimensão privada no interior da ordem corporativa criada pelo Estado Novo de Vargas, passa a instrumentalizar sua presença, estabelecendo-se entre ambas dimensões um critério de externalidade. Rompe-se com a situação anterior, redefinindo-se a dimensão pública como monopólio do Estado e liberando a dimensão privada para que esta pudesse se adensar e se afirmar como a base de uma nova sociabilidade conformada por empreendedores particulares. Se, por um lado, este processo conseguiu um êxito significativo, liberando a racionalidade instrumental dos interesses econômicos, o que correspondia à lógica da aceleração da acumulação capitalista, representou, por outro lado, “uma verdadeira hecatombe política, ético-moral e no tecido social, aprofundando a tradicional atitude na população de indiferença à política, dificultando, pela perversão individualista, a passagem do indivíduo ao cidadão, e agravando em escala inédita a exclusão social, ao mobilizar setores subalternos do campo para os polos urbano-industriais, onde chegavam destituídos de direitos e de proteção das políticas públicas” (VIANNA, 1994). A escala, o ritmo, a intensidade e a magnitude das transformações que se operaram foram sem precedentes na história do Brasil, a ponto de um investigador brasileiro qualificar o que se Golpe de Estado, regime autoritário e transição democrática 159