1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 365
da tortura e suas consequências ulteriores, como no caso de frei
Tito de Alencar, que, quatro anos após sua prisão, se suicidou, na
França, em decorrência das debilidades psicoemocionais causadas
pelo período de tortura.
A bancária Inês Etiene Romeu, 29 anos, denunciou:
(...) A qualquer hora do dia ou da noite sofria agressões físicas e
morais. “Márcio” invadia minha cela para “examinar” meu ânus e
verificar se “Camarão” havia praticado sodomia comigo. Este
mesmo “Márcio” obrigou-me a segurar seu pênis, enquanto se
contorcia obscenamente. Durante este período, fui estuprada duas
vezes por ”Camarão” e era obrigada a limpar a cozinha completamente nua, ouvindo gracejos e obscenidade os mais grosseiros.7
O Código Penal Brasileiro é de 1940 e considera o estupro
como crime hediondo, ou seja inafiançável, porém foi ferramenta
extremamente utilizada pelos órgãos repressores, visando conseguir informações junto às presas e presos políticos. No livro Mulheres que foram à luta armada, temos o depoimento de Áurea
Moretti que, segundo o autor, ainda treme de ódio ao relembrar
determinadas cenas:
Os soldados vinham na grade e gritavam: “Boneca terrorista”.
Diziam que iam jogar dados para saber qual seria o primeiro da fila.
Uma noite, desmaiada de cansaço e de pau de arara, eu dormi na
cela. De repente, no escuro, um tropel na escada, uma gritalhada
dentro do quartel. Já acordei com eles invadindo, arrebentando,
xingando, um já dando chute, outro me amarrando com a corda. Me
levaram escada acima. Era a Operação Bandeirantes que tinha
chegado no pedaço. E já tinha uns caras passando a mão no meu
corpo, dizendo que iam casar comigo. Um deles virou meu noivo.
“Não, você não, quem vai casar com ela sou eu”, me agarrou.
Era uma cena louca, um corredor cheio de soldados dos dois lados,
eu passando com aquele bando. O cara agarrado em mim falou “eu
vou casar com ela” e de repente eles começaram a cantarolar a
7
Brasil nunca mais. Arquidiocese de São Paulo. São Paulo: Vozes, 1985, p. 47.
Violência na ditadura con G&