100 anos da Revolução Russa PD_ESPECIAL | Page 70

50 anos da publicação de seu primeiro volume em 1867) e cujos fundamentos já haviam sido anunciados sinteticamente no famoso prefácio à Contribuição à crítica da economia política (1859) – fora erigida em cânone incontestável pela II Internacio- nal Socialista. No referido preâmbulo, o intelectual alemão asse- verou: “Uma sociedade jamais desaparece antes que estejam desenvolvidas todas as forças produtivas que possa conter, e as relações de produção novas e superiores não tomam jamais seu lugar antes que as condições materiais de existência dessas relações tenham sido incubadas no próprio seio da velha socie- dade. Eis porque a humanidade não se propõe nunca senão os problemas que ela pode resolver, pois, aprofundando a análise, ver-se-á sempre que o próprio problema só se apresenta quando as condições materiais para resolvê-lo existem ou estão em vias de existir”. (Marx, 1983, p. 233). A propósito e posteriormente, no início dos anos 1930, nos Cadernos do cárcere, Gramsci retomaria esse excerto para dele deduzir o conceito de revolução passiva. (2002, p. 321). Para Gramsci, as agruras da guerra (com o morticínio de 5 milhões de soldados russos) teriam criado condições (vontade coletiva), de maneira célere e inusitada, para a tomada do poder pelos bolcheviques num país atrasado, de capitalismo incipiente como a Rússia. Sem dúvida, a guerra potencializou a crise estru- tural que já era latente em todo o imenso império russo, abar- cando inúmeros problemas acumulados secularmente: dominân- cia tirânica da autocracia czarista, subjugação de nacionalidades não russas, brutal opressão do campesinato, bloqueios à organi- zação da sociedade civil, inexistência de direitos mínimos (tanto civis como políticos) etc. Em 1917, a crise irrompe com tal força que desintegrou o todo poderoso império czarista. “A autocracia czarista não foi exata- mente derrubada por ninguém: desapareceu de cena em meio à guerra, sem que existisse qualquer alternativa óbvia para assu- mir o poder. A Duma [parlamento russo], que desfrutava de prestígio zero, era incapaz de substituí-la. Apenas produziu um governo provisório e saiu da cena política” (Lewin, 2007, p. 341). Criara-se uma situação caótica que se agravou com a constitui- ção de um governo provisório privado de credibilidade dirigente e impotente para enfrentar as graves circunstâncias. “Nesse contexto sombrio, o Governo Provisório, composto principal- mente de socialistas revolucionários e mencheviques (...), perce- 68 José Antonio Segatto