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Sociedade

Pontivírgula

seguro para muitas pessoas LGBTI expressarem aberta e seguramente a sua relação, com cerca de 57% dos mesmos a afirmar que evitam frequentemente ou sempre andar na rua de mãos dadas com o respetivo parceiro. Para além disso, no que a questões médicas e fisiológicas diz respeito, um homem homossexual ou bissexual é visto como alguém com maiores comportamentos de risco, podendo ser até percecionado como alguém possivelmente doente, muito fruto dos casos de VIH/ SIDA que, nos anos 80, começaram a aparecer em Portugal e que, desde aí, são continuamente associados a este grupo. Porém, também tal pode ser refutado, já que, desde os anos 80, muito se alterou e o risco de contrair este vírus, segundo o relatório de 2020 do Programa Nacional para a Infeção VIH/ SIDA, é superior entre a população heterossexual, que totalizam cerca de 57,8% dos casos. A muitos homens homossexuais ou bissexuais é, inclusive, pedido um ano de abstinência antes de fazerem uma doação de sangue, mesmo que estes tenham tido apenas um parceiro durante todo esse tempo. Fica, assim, como que subentendido, que um homem heterossexual pode ter quantas parceiras sexuais quiser durante esse tempo, sem que quaisquer constrangimentos lhe sejam apresentados, ao passo que o homem homossexual ou bissexual será sempre aquele entendido como o promíscuo e com os comportamentos lascivos, ainda que tal não seja o caso. Depreendemos, portanto, que estes impedimentos resultam apenas de escolhas arbitrárias dos próprios profissionais de saúde e que são fundadas em estigma e preconceito, sem qualquer base legal, algo que é, portanto, urgente de mudar, muito por meio de informação e consciencialização daqueles que se encontram responsáveis por decidir quem pode ou não doar sangue. Tentei mostrar no decorrer do texto, que esta pretensa de existir um grupo de risco, com base na orientação sexual do mesmo, é falsa e falaciosa, especialmente tendo em conta que todas as doações são primeiro testadas em busca de essas tais doenças infeciosas que possam existir. É, assim, algo que transcende, também, o género e sexualidade de cada um, sendo, portanto, esta prática recorrente mais de precaução e caução do que propriamente de estigmatização e diferenciação.

Não me parece, assim, que faça mais sentido que situações destas continuem a acontecer, acima de tudo quando ao nosso dispor temos todos os meios possíveis de informação que nos mostram que esta quase segregação, com base no género ou na orientação sexual, é quase que abismal, uma barbárie. Urge, por isso, incentivar e criar a mudança e seguir o exemplo de muitos outros países, como o Brasil ou o Reino Unido, onde a não discriminação de homossexuais para doação de sangue é também já imperativa. Urge, também, não criar estas leis apenas “para inglês ver”, sem que depois haja a efetiva fiscalização daqueles não que são proibidos, mas sim que proíbem quem é elegível de fazer estas doações, sobretudo em momentos de aperto, como foi o caso deste passado mês de janeiro. Urge que coloquemos na dianteira pessoas capazes de ultrapassar o preconceito e que vejam quem está à sua frente como alguém disposto a ajudar e não as suas escolhas sexuais que, a não ser que se encontrem nos casos de risco acima mencionados, devem ser alheios ao recrutador.

Tenhamos, por isso, tudo isto em conta e façamos para que os recursos disponíveis sejam os máximos possíveis, não contribuamos para a sua escassez, trabalhemos sim para a sua abundância, remando todos como que no mesmo barco ao invés de em dois barcos por completo separados entre si.

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Doação de sangue.

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