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Sociedade

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Foi no dia 26 de Outubro de 2020 que Inês Marinho criou um movimento que veio abalar as redes sociais. O #nãopartilhes nasceu com o intuito de lutar contra a divulgação de conteúdo de natureza íntima, apoiar as vítimas que os tiveram expostos e alertar para esta ocorrência que vemos tantas vezes. Num Instagram live, afirma que o que mais a assusta é “a faixa etária da idade das pessoas que fazem os comentários retrógrados e machistas. Não eram só homens de 60 anos ou 80 anos, era uma geração completamente diferente, muito mais nova. Já mudámos tanto, já aprendemos tanto, as pessoas também têm que crescer com os movimentos e com o tempo”, realçando assim a ideia de que existe um problema multigeracional que tem de ser extinto. 

A partilha de vídeos ou imagens sem consentimento tem-se dinamizado à medida que as redes sociais vão crescendo e ficando mais populares. Incluem plataformas como Instagram, Whatsapp, Snapchat, e até sites de pornografia - como o Pornhub -, entre outros.

Estes grupos nas redes sociais, predominantemente masculinos, que recebem e divulgam, são a raiz do problema. O indivíduo partilha uma imagem ou um vídeo para um grupo, depois alguns dos membros desse grupo enviam para outros grupos e numa questão de horas ou minutos as imagens tornam-se virais e de conhecimento público. Repentinamente futuros empregadores e familiares podem ter acesso a conteúdo privado que era suposto ser apenas para uma pessoa, e este não desaparece porque na internet nada pode ser permanentemente apagado.

Apesar destes pensamentos serem maioritariamente machistas e negativos para com o sexo feminino, também há mulheres que têm este tipo de pensamento: que veem fotografias de uma rapariga nas redes sociais e a julgam por diversas razões, subscrevendo aquele pensamento masculino de que ela está de facto a expor-se e, por isso, deve ser caracterizada por X,Y ou Z , insultada ou assediada. “Quero mesmo virar a história: quero que se chegue a um ponto em que um rapaz não vai partilhar as fotos da namorada porque sabe que isso é horrível e que ninguém vai compactuar. E nós agora estamos a fazer o contrário: estamos a repudiar as vítimas.”, comenta Inês.

Estes grupos nas redes sociais, predominantemente masculinos, que recebem e divulgam, são a raiz do problema.

Embora cada história seja diferente, todas contém o mesmo núcleo: foram divulgadas imagens sem o consentimento da pessoa, quer estas sejam verdadeiras ou não, tiradas voluntariamente ou não, partilhadas ou roubadas. E têm o mesmo desfecho: a culpa é da mulher que está a ser retratada nos vídeos ou fotos. “Ela pôs-se a jeito” é possivelmente das frases mais comuns relacionadas com este tema, mas talvez possamos pensar que a culpa não é de quem enviou a foto para uma pessoa em quem confiava, mas sim da pessoa que escolheu quebrar essa confiança e divulgar o conteúdo que eram apenas para os seus olhos, e não de terceiros. Isto pode ser verificado com um estudo feito entre alunos universitários, no qual está descrito que a razão para este envio é principalmente “estarem numa relação com a pessoa a quem enviaram, sendo a relação caracterizada por respeito” ou “também é motivado por alguém que quer começar a estabelecer relação com o outro e julga que este é um caminho mais fácil de o conseguir”, afirmou a psicóloga Patrícia Mendonça, quando foi entrevistada para o jornal Público.

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Por Carlota Belo

Quando a intimidade se torna uma arma #naopartilhes

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